“One more thing, Sofie… is she aware her daughter is still alive?”
Quando falo sobre “Kill Bill”, sem dúvida alguma, me posiciono como um apaixonado. Um amante inalienável que quando tece algum comentário sobre a obra-prima máxima de Tarantino, redige as palavras com amor, com respeito e acima de tudo com idolatria. Mesmo anos atrás, quando tinha pouca noção cinematográfica, algo me atraiu e me rendi ao charme e qualidade do longa; tempos se passam e a admiração tende a aumentar cada vez mais, quando se descobre que é muito mais do que se pensa, afinal, isso é Tarantino. Transcende o patamar das palavras, a forma como sou grato a Quentin Tarantino Por trazer a vida um dos filmes mais simples e mais complexo, mais imoral e mais ético, e mais irreal e realista ao mesmo tempo. Dois capítulos tão díspares, e ao mesmo tempo tão conjugados.
“That woman deserves her revenge. And we deserve to die”
Pouquíssimos filmes conseguem ter uma seqüência melhor ou igual ao original; e nunca será possível afirmar isso em relação ao segundo filme da saga da noiva, até porque em suma, ambos são um filme só. Mas, se me perguntarem qual o melhor, eu direi talvez que foi Kill Bill vol.1, seja por uma extravagância única, ou por uma estética maravilhosa, uma história legal, um roteiro corajoso e inteligente, e uma direção inalienável, eu me identifiquei mais com o primeiro filme. Mas o que acontece com o segundo, é que ele é muito diferente do que qualquer pessoa poderia imaginar, e no caso, quem esperava os litros de sangue derramados que vimos no primeiro capítulo, pode se decepcionar; entretanto, quando observamos ambos os filmes como um todo, ele explora numa medida equilibrada os quesitos história/ação, sendo que são mais explorados no vol.2 e vol. 1 respectivamente.
Somente por está prestigiando uma obra do mestre Tarantino, tudo o que vier, é lucro. Kill Bill vol.2 é maravilhoso e desagradável. Maravilhoso, por conseguir dar prosseguimento de uma forma ímpar a história enigmática de Beatrix; desagradável, por ser o fim de uma das melhores histórias já apresentadas no mundo cinematográfico. Esse segundo capítulo dá uma profundidade até então inesperada na história, e mostra que Kill Bill vai muito além de lutas baratas e um diretor maluco. É muito triste ter que observar os créditos subindo, e ficar impotente perante aquilo. É como ler um bom livro; aquele que não se tem vontade que termine, e é triste ter que fechá-lo. Mas quando gostamos mesmo, vamos o tempo todo bisbilhotá-lo e redescobrir a magia dos personagens. Literalmente o DVD foi uma criação divina, pois em filmes como esse podemos fazer o mesmo.
“You and I, have unfinished business!”
Nesse segundo filme, a Noiva ou Beatrix Kiddo (Uma Thurman) têm que execultar Budd (Michael Madsen), Elle Driver (Daryl Hannah) e por último Bill (David Carrodine) que foram os únicos que sobraram em sua “lista de morte”, já sendo assim exterminados os dois primeiros nomes de sua lista. O motivo: Ambos fizeram uma armadilha para ela no dia do seu ensaio de casamento, e a massacraram e a todos que estavam com ela, então quando acorda após de cinco anos em coma, ela busca por vingança e faz todos que a traíram pagarem por isso.
Foi tudo cuidadosamente pensado, na hora de conduzir e criar essa maravilhosa história, que expande o universo do primeiro filme, e o completa de forma digna e singular. Apesar de ambientados e idealizados de forma bem diferente, os filme se assemelham muito, e criam uma perfeita combinação, o necessário e o agradável, e nos conduz para a atmosfera presente no filme e cada personalidade existente nele.
As atuações são muito dignas, salientando a atuação de Uma Thurman, que mais uma vez foi louvável (que inclusive foi para a pré-seleção do Oscar, juntamente com a David Carradine), e todo o elenco se sai muito bem, todos muito certos do que estão fazendo, e destacando cada característica de seus complexos personagens.O mundo que Tarantino criou, é sublime e a filosofia, o drama e o sentimento, são sempre ressaltados, em cada ação ou cada acontecimento existente. Inclusive, bisbilhotando algumas informações sobre o filme, descobri que, juntamente com o volume um, os dois filmes acumulam uma quantidade de indicações e arrecadações de prêmios, onde somados, o resultado dá algo próximo da sutil casa da centena; isso não é para todo mundo, não é mesmo?
Um dos pontos positivos desse filme foi o realismo que ao contrario da massiva onda de filme Hollyoodianos ele não usa CGI ou qualquer uma dessas técnicas de efeitos especiais, e tudo no filme segue essa linha, tornando-o mais violento e digno; bom para nós, ruim para os dublês. Aliás, Zoe Bell, dublê de Uma, deve estar cheia de hematomas, e como disse ela mesma, alguns ossos foram quebrados; contudo, parece que o esforço foi recompensado. A fotografia do filme é esplêndida, à là Kubrick, com um contraste das cores que chamam muito a atenção, deixando um clima ideal para completar cada momento ou cada sentimento vivido. Mais uma vez as cenas em preto-e-branco dão um show à parte e se tornam as mais belas possíveis.
“She must suffer, to her last breath”
O roteiro dessa vez pendeu mais para o lado dos diálogos, e embates psicológicos, e literalmente não podia ter feito coisa melhor. São perfeitos os diálogos de uma grandiosidade intelectual inquestionável, que preza também pelo estudo mais aprofundado da mente do ser humano e de pessoas violentas que, aliás, nisso Tarantino já é escolado, vide o mega-cultuado “Pulp Fiction: Tempos de Violência”, em minha opinião o terceiro melhor filme de Tarantino, perdendo apenas para os dois volumes de Kill Bill. Essa combinação entre as lutas e história do primeiro filme, e a carga emocional do segundo completam-se com uma harmonia indescritível. Tarantino cuidou muito bem desse quesito, e assegurou que as más línguas fossem mordidas pelos alienados seres que o acusaram da “perda de criatividade”. Os momentos onde as falas são essenciais são inúmeros, e temos prazer em acompanhar e gravar cada uma delas; a conversa entre Uma e Bill (esse último visivelmente o alterego do diretor) , seja na igreja ou na casa dele, são extremamente bem estruturadas e mostram a real profundidade da relação entre seus personagens; destaque para a genial sacada da conversa do Superman. Ele também capricha em Elle Driver e em Budd, fazendo com que suas marcas sejam deixadas, e com muita classe (ou com a total falta dela) respectivamente.
Tarantino tentou nesses dois filmes outro ponto louvável, que é a incrível fusão de cultura, japonesa, do velho oeste, oriental e ocidental, tudo de forma mais americanizada mais acessível ao público-alvo, com diversas homenagens a diversos pontos que ele admirava em produções do passado. Aliás, o que falar sobre Tarantino. Ele é o motivo dessa obra ter uma qualidade tão notável. Literalmente nenhum diretor teria a capacidade de dirigir Kill Bill, e obter um produto final de tamanho destaque. Ele consegue por diversos momentos transformar simples movimentos e ações, em poesia; e não é isso que o cinema é na verdade? E são inúmeros os exemplos, como na cena da igreja onde ocorre o verdadeiro reencontro entre os dois; aqueles passos vagarosos e medrosos que vão sendo acompanhados até onde eles de fato se cruzam; ou na cena em que Beatrix sai do quarto da filha que acabou de reencontrar com receio que não a veja mais, ao som de “About Her” de Malcolm Mclaren, onde toda a cena está no ritmo da canção. Talvez perfeito não seja suficiente para classificá-las.
A trilha sonora é muito boa, mas não tão divertida como a do filme anterior, porém elas se adéquam perfeitamente ao clima existente nos filme e dá profundidade emocional das situações e sentimentos vividos. Alguns sons apresentados podem até incomodar, mas se ofuscam em meio aos diversos bons momentos presentes nos filmes. Mas podemos observar o importante dedo de Ennio Morricone na trilha, o que de longe, é uma honra e tanto.Em fim… Tarantino conseguiu de novo, e nos apresentou mais uma obra de arte de grande porte. Aquele tipo de filme que é tão perfeito que soa bem até para um ignorante; mas que presa pelo público que aprecia um cinema alternativo e que almeja por inovações e abusos, que somente cineastas tão capacitados como ele, pode fazer. Um filme que teve uma grande repercussão, e que sempre será inesquecível. Juntamente com o vol.1 formam o melhor filme de Tarantino e um dos melhores da humanidade, e justifica-se.
“The lioness has rejoined her cub. And all is right in the jungle.”
Cotação: (10/10) \o/